terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Sê jaz


a Lucas C. Branco

Da coragem do vivido no
hoje, no ontem, no amanhã,
e dos restos que daí
se nos faça,
creio, 
eu que não 
creio,
naquilo que te ergue,
te queda,
te lança
a mim, a nós. E em nossos
nós
a sós,
juntos, insistamos no 
amor
cheio
de
si

* Imagem: L'Art de la Convesation  (1950), de René Magritte.

segunda-feira, 18 de junho de 2018

tentei morrer
e era poesia
a falta de ar
a falta de dia

morria

* Morte della Virgine, de Caravaggio (1606-09).

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

o livro dos dias


olho os meus dias como quem
olha solenemente os carros negros que se
seguem ao ataúde solitário
o solitário absoluto
a solidão em si
plena
sem máscaras

olho os meus dias como quem
olha a pista suja e triste
depois que o bloco passa
e escuta os tamborins silenciados
o silêncio
quando já não há fantasias
nem máscaras

olho os meus dias como quem 
não vê
olho a sombra, a penumbra, a escada
vazia
o livro fechado e
não lido
a louça suja do que
não foi comido
o sol que se pôs sem nascer

olho os meus dias 
- essa eterna noite chamada vida -
mas nada enxergo
por quê?



* Imagem: Head and bottle (1975), de Philip Guston.

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Hacai #9 - V


da noite, um sussurro:
muitos vivos, poucos vivem.
sono breve, leve, surdo.

* Imagem: P. 726 (1977), de Gottfried Honegger.

quarta-feira, 20 de julho de 2016

soul


não morro de amores
nem vivo
sou inconstância, incerteza
calafrio
não choro de dores
nem rio
sou a dureza da leveza
desvario

* Imagem: Desarrollo del triángulo (1951), de Tomas Maldonado.

domingo, 24 de abril de 2016

Poeminha às 5


a Luiz

que agonia!
tem amor 
mas não tem beijo
só poesia


* Imagem: People (1982), de Leon Ferrari.



quarta-feira, 9 de março de 2016

Deus absconditus


e depois de um dia tépido
e de me demorar em
decidir
se sou feliz aqui ou outrora,
caminho à rua de minha casa,
estafado...
as janelas do cortiço escancaradas
e as vidas que ali se revelam e passam vulgarmente
me são a epifania que faltava.
giro a chave, 
abro a porta como quem dobra os joelhos ante o mistério 
e meus os olhos marejados me fazem sentir placidamente
o bafo quente e aprisionado escorrer do meu quarto solitário, me devorando:
sim, sou feliz.


* Imagem: Skeletons trying to warm themselves (1889), de James Ensor.