sexta-feira, 11 de novembro de 2016

o livro dos dias


olho os meus dias como quem
olha solenemente os carros negros que se
seguem ao ataúde solitário
o solitário absoluto
a solidão em si
plena
sem máscaras

olho os meus dias como quem
olha a pista suja e triste
depois que o bloco passa
e escuta os tamborins silenciados
o silêncio
quando já não há fantasias
nem máscaras

olho os meus dias como quem 
não vê
olho a sombra, a penumbra, a escada
vazia
o livro fechado e
não lido
a louça suja do que
não foi comido
o sol que se pôs sem nascer

olho os meus dias 
- essa eterna noite chamada vida -
mas nada enxergo
por quê?



* Imagem: Head and bottle (1975), de Philip Guston.